Entrevistando Biofacers: Kennedy Borges

Dando sequência à nossa editoria ‘Entrevistando Biofacers’, hoje trazemos incríveis experiências, além de dicas do biólogo e fotógrafo de natureza Kennedy Borges-Road. Durante as entrevistas, buscamos contar um pouco da história de alguns destaques da nossa plataforma, estimulando e inspirando outros usuários e fotógrafos iniciantes.

Foto: Arquivo pessoal Kennedy Borges

Conheça um pouco mais sobre o Kennedy e sua paixão pela vida selvagem: 

 

Qual a sua profissão? Você vive de fotografia?

Sou biólogo de formação, mas, antes da biologia também fiz curso de educação física. Minha profissão atual é analista ambiental do Instituto Chico Mendes. Passei no concurso do IBAMA em 2005 e em 2007 entrei no ICMBio. 

Hoje, não vivo de fotografia, mas gostaria, rs. É uma atividade que me dá muito prazer e proporciona novas descobertas. Por exemplo, quando você fotografa um bicho que não conhece e vai identificar. Acho super interessante. 

 

Como começou essa paixão por animais silvestres e conservação?

Desde menino eu remava canoa, comecei com aproximadamente 15 anos. Praticava no Rio Cristalino, que fica no município de Cocalinho, extremo leste do Mato Grosso. Por isso, eu sempre observava a fauna, principalmente aves, e tinha um interesse muito grande. Naquela época não tínhamos essas tecnologias digitais, mas eu tinha uma maquininha bem simples. Comecei a fotografar por curiosidade as aves que eu encontrava nas descidas de longa distância. Passava 4, 5, até 6 dias descendo o rio. Cada dia dormindo numa praia, eram experiências fantásticas.

Hoje já estou com 54 anos e nunca deixei de praticar, todo ano eu faço uma descida dessas. Foi assim que começou minha paixão por animais silvestres. Em seguida, fiz faculdade de educação física e depois de biologia. Dessa forma, consegui unir o que eu gostava com o que queria realmente fazer.

 

Tem algum grupo de animais (mamíferos, répteis, aves, etc) que você prefira registrar?

Cada viagem que eu faço, saio fotografando qualquer tipo de fauna que encontro pela frente. Seja vertebrado, invertebrado, qualquer grupo. Não tenho mais essa de escolher, estou gostando de registrar o máximo que eu puder em cada viagem.

Anta (Tapirus terrestris) | Foto: Kennedy Borges

 

Com que frequência você sai para fotografar?

Se eu pudesse sair todo dia, eu sairia, rs. Claro que eu dependo de chuva, condições climáticas, de tempo no meu trabalho, etc. Mas, uma manhã que você sai pra dar uma volta, das 6h da manhã até 7h30, já dá pra fazer altas fotos. 

Eu sempre prefiro fotografar aos finais de semana, pois fico mais tranquilo, não tem trabalho. Mas se você pensar no período de um mês, eu fotografo pelo menos uns 10 a 15 dias (não consecutivos, alternados). 

Insetos | Foto: Kennedy Borges

No seu perfil existem muitos registros de vocalização. Como começou essa prática? 

Eu comecei gravando anfíbios. São materiais bem antigos, de uns 20 anos atrás. Depois, comecei a gravar aves e hoje tenho mais de 900 aves gravadas só no Brasil! Aos poucos, vou publicando esses áudios no Biofaces, conforme vai me sobrando tempo. 

Essa prática começou no sentido de registrar o bicho por completo. Às vezes você tá ouvindo, principalmente à noite ou de madrugada, mas não consegue ver o animal. Então, você faz um registro sonoro e ele já vale, cientificamente falando. Claro que é ótimo fazer a fotografia, mas quando você não consegue, é melhor fazer a gravação para obter esse registro. 

É interessante dizer que hoje estou conseguindo gravar também grupos de macacos, gravei até um jacaré-açu (Melanosuchus niger) e um boto. Quanto mais registros eu faço de vida silvestre, das mais variadas formas, mais contente eu fico. 

 

Quais equipamentos você usa para registrar a vida selvagem? Tanto câmera (e lentes) quanto gravadores.

Eu uso um gravador de voz digital Panasonic, o Rr Us551. Ele é bem pequeno, cabe no bolso e dá um resultado legal. Uso também uma Nikon p1000, uma câmera compacta, excelente, que me permite fazer pequenos filmes com qualidade 4K. Além disso, uso também uma Canon EOS 70D com uma lente 300mm F/4. Esse é o meu conjunto de equipamentos básicos. 

Eu acho que essas câmeras, tanto as DSLR (Digital Single Lens Reflex) quanto as compactas, há diferença na qualidade da foto, só que depende da situação. Por exemplo, se um gavião pousa lá longe, até uns 300 metros, com a compacta você consegue pegar melhor do que a DSLR.

Foto: Arquivo pessoal Kennedy Borges

 

Você geralmente sai para fotografar sozinho ou acompanhado?

Eu moro na cidade de Aruanã e aqui todo mundo me acha meio maluco, rs. Eu saio sozinho pela região quase 100% das vezes. Exceto quando vem um grupo de amigos, aos finais de semana, mas é raro. 

Existem as situações em que eu viajo já acompanhado, geralmente com uma turma de observadores de aves. Quando isso acontece, o grupo é de no máximo 2 ou 3 pessoas. Aí nós contratamos um guia no local de destino e fazemos todo o planejamento antecipado. Eu acho que se for muita gente em uma trilha, ou só para fotografar mesmo, o resultado não sai tão bom quanto poderia ser.

Quando saio sozinho, vou no máximo acompanhado de um barqueiro no Rio Araguaia ou Rio Vermelho. Mas os barqueiros já sabem meu esquema, sabem que eu gosto de silêncio. Quando faço trilha, eu vou de carro e já monto uma camuflagem para que o bicho não me veja. Dessa forma, já consegui fotografar até mesmo uma onça-pintada (Panthera onca) a 20 metros de distância. Cada um tem sua forma e eu prefiro assim, 90% das vezes vou sozinho.

Jacamaraçu (Jacamerops aureus) | Foto: Kennedy Borges

 

Qual foi a sua melhor experiência no universo de vida selvagem?  

Eu já morei nos EUA e fiz algumas fotos lá na época. Mas como foi há muito tempo, meu equipamento era bem fraco comparado aos de hoje. Então, não pude aproveitar tão bem as oportunidades fotográficas que tive. Eu não tinha tanto conhecimento em fotografia, etc. 

Mas, ainda assim, acho que as melhores experiências que eu já tive foram na região norte do Brasil. Principalmente nos estados do Acre, Roraima e Amapá. E sabe por quê? Porque lá há muito endemismo, ou seja, é possível encontrar muitas espécies que só ocorrem naquelas localidades e ainda assim são raras. Por exemplo, um que eu gostei muito de fazer foi o Tiê Preto e Branco (Conothraupis speculigera), acredito que tenha sido meu auge na observação de aves. Tive a oportunidade de fazer a primeira gravação dele publicada no Brasil – no WikiAves especificamente. 

Além disso, também consegui fazer uma das melhores gravações da Codorna-mineira (Nothura minor) dentro do Parque Nacional das Emas, localizado em Chapadão do Céu/GO. 

 

Para você, quais são os pontos essenciais na observação de fauna? 

O primeiro é o silêncio. Ele é primordial para que os animais em observação não notem sua presença. O barulho que o ser humano faz pode espantar o animal bem na hora do clique perfeito.   

O segundo é a camuflagem. Quando você tiver tempo, aconselho fazer um “hide”, que é um esconderijo camuflado para o animal não te perceber. Além disso, também é interessante vestir trajes que ajudam na camuflagem, com cores neutras. 

Nesses anos de experiência, percebi que, quando você fotografa um animal que não te notou, você captura exatamente a essência dele na natureza. 

Foto: Arquivo pessoal Kennedy Borges

 

Hoje, você está entre os maiores fotógrafos de espécies dentro do Biofaces. Qual a sua dica para quem quer alcançar o mesmo resultado?

Hoje estou em segundo lugar. Em primeiro está o Diogo Luiz, que é fantástico e uma inspiração. Um dia eu chego no nível dele, rs. 

Mas acho que a principal dica é, assim como fiz, abrir o leque. Começar a fotografar desde formigas até baleias. Você vai para campo, seja numa praia, floresta, independente do bioma, e fotografa tudo que aparecer! Se passar um roedor na sua frente, uma cobra, se surgir uma ave, registre. Tem pessoas que ficam muito focadas em um grupo animal. Minha dica é abrir o leque. 

Também é importante ficar atento a todos os movimentos. A gente que já anda há muito tempo em trilhas pelo Brasil passa a ter um poder de leitura do ambiente. De entender quando a floresta está calma, perceber qualquer movimento diferente e principalmente a variação de cores. O que é normal ver dentro de uma floresta? O verde, o marrom, preto, cores mais escuras e comuns. Aí de repente você vê um pontinho vermelho passando, pulando de galho em galho e seu olho já fica treinado pra isso. Acho que o conselho básico é esse. 

Zogue-zogue (Callicebus moloch) | Foto: Kennedy Borges

Enfim, é interessante abrir o leque para conseguir melhores resultados. Não é nem pela questão de pontuação em si. Acho essa competição super saudável, pois quanto mais espécies e registros cadastrados na plataforma, mais conhecimento é gerado. 

 

Para finalizar, gostaria de dizer que estou gostando muito do Biofaces. Acho uma criação fantástica do Leonardo Avelino Duarte. Foi um alento, um grande incentivo para nós que gostamos de registrar a fauna. Sempre que saio para fotografar a natureza, vou em busca da felicidade. E como a felicidade só é real quando compartilhada, muito me apetece compartilhar os registros no Biofaces. 🙂  

2 Comments

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Ary Soaresreply
5 de março de 2020 at 14:15

Matéria muito boa e esclarecedora sobre este “maluco” que além de rockeiro, vejam só que contradição! Faz da camuflagem e do silêncio mecanismos para seus fantásticos registros da natureza.

Sérgio Murilo Munhoz Fontanareply
9 de março de 2020 at 10:45

Meu amigo. Parabéns. Você, alem de grande profissional junto ao IBAMA e ICMBio é grande, excelente fotógrafo. E para quem não sabe ainda, é um músico de mão cheia, virtuoso na voz e no violão. Nota 10, com louvor. Mais uma vez, meus parabéns, meu amiho.

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